O HOMEM COMO ESPÉCIE E A QUESTÃO AMBIENTAL

Concordo com o Žižek, em “Vivendo no fim dos tempos”, quando argumenta que o problema da sustentabilidade vem criando uma nova noção de “nós”; uma noção que congrega os seres humanos em um “sujeito universal”, na concepção de espécie. Ele diz:

Com a ideia dos seres humanos como espécie, a universalidade da humanidade recai sobre a particularidade de uma espécie animal: fenômenos como o aquecimento global nos tornam conscientes de que, com toda a universalidade de nossa atividade prática e teórica, em nível básico somos apenas mais uma espécie viva no planeta Terra. Nossa sobrevivência depende de certos parâmetros naturais que, automaticamente, consideramos pressupostos.

A lição do aquecimento global é que a liberdade da humanidade só foi possível contra o pano de fundo de parâmetros naturais estáveis de vida na Terra (temperatura, composição do ar, água e energia suficientes etc.): os seres humanos só podem “fazer o que quiserem” enquanto permanecerem marginais, a ponto de não perturbar seriamente as pre-condições naturais.

A limitação de nossa liberdade – que se torna palpável com o aquecimento global – é o resultado paradoxal do próprio crescimento exponencial de nossa liberdade e de nosso poder, isto é, de nossa capacidade crescente de transformar a natureza à nossa volta, a ponto de até desestabilizar a própria estrutura da vida (p.224-225).

(isso considerando, evidentemente, uma associação direta entre ampliação das liberdades humanas com crescimento material…com dominação política e material do homem sobre o espaço natural…com transformação da base de recursos materiais naturais em riqueza, etc)

Mas a observação mais interessante do cara vem mais a frente. O homem como espécie, ao se preocupar com o ambiente natural não faz um exercício de altruísmo, mas antes, de egoísmo:

O conflito entre capitalismo e ecologia pode parecer um conflito típico entre interesses utilitários-egoístas patológicos e o cuidado propriamente ético pelo bem comum da humanidade.

Num exame mais atento, logo se torna claro que a situação é justamente o contrário: são nossas preocupações ecológicas que se baseiam na noção utilitária de sobrevivência e, como tal, não têm uma dimensão propriamente ética, defendem apenas um interesse esclarecido, em seu aspecto mais elevado de interesse das futuras gerações contra nosso interesse imediato (p.226-227).